Fazer uma visita ao Templo de Uluwatu na ilha de Bali, Indonésia, pode ser um roteiro bonito, mas não é lá muito seguro. Há um número considerável de trombadinhas no caminho, prontos para sequestrar seus objetos pessoais e só devolvê-los mediante fiança. O problema seria de segurança pública, não fosse pela natureza dos membros da gangue: quem anda fazendo a festa com os pertences dos turistas há um tempo são bandos de macacos-cinomolgos (Macaca fascicularis), bastante comuns no sul do país.
Capturando óculos, câmeras, chapéus e até joias, esses primatas garantem uma refeição farta para si. Depois de tomar o objeto, é só esperar que algum guia do templo inicie uma vantajosa negociação, na qual trocam os objetos por saborosas iguarias. Se derem sorte, os brindes podem ser até lanchinhos menos convencionais, que fogem da dieta que eles costumam receber dos tratadores – como por exemplo, biscoitos cream-cracker.
A prática já era velha conhecida de quem mora por lá ou visitou a região nos últimos anos. Mas, apesar dos estudos científicos acumularem inúmeras provas do senso intelectual e esperteza dos macacos, esses hábitos nunca tinham sido estudados in loco.
A tarefa foi assumida por um grupo de pesquisadores liderados por Fany Brotcorne, da Universidade de Liège, na Bélgica. Eles passaram quatro meses mapeando esse complexo sistema de roubos e trocas entre macacos e humanos no sul de Bali – mais especificamente no Templo de Uluwatu. Durante esse tempo, os cientistas registraram mais de 200 casos de furtos feitos pelos símios, conforme descrevem em seu estudo, publicado no periódico científico Primates.
Cinco bandos de macacos que habitam essa região foram acompanhados mais de perto. Dois dos grupos mantinham um maior contato com os humanos, passando horas nas redondezas do templo e interagindo com turistas. Não foi surpresa que a maioria das ocorrências policiais tenham sido obra exatamente desses bichos, mais familiarizados com artigos como câmeras, bonés e celulares. Bandos com um número maior de machos jovens, mais agressivos e imprevisíveis também registraram mais roubos em relação aos outros.
Os pesquisadores acreditam que esse costume não é uma prática inata. Ou seja, o instinto criminoso não nasceu com os macacos, mas se tornou uma prática a partir do convívio com os humanos – sendo passada de indivíduo a indivíduo. Um primata pioneiro teria se dado bem com a troca e ensinado o segredo aos outros, até institucionalizar os roubos no bando.
E o que reforça essa tese da criação de uma escola do crime é que o costume de roubar é exclusivo dos macacos do Templo de Uluwatu. Os pesquisadores não encontraram evidências consistentes da prática em qualquer dos outros templos de Bali que também contam com populações de Macaca fascicularis. O objetivo é agora entender como isso se tornou uma cultura local, passada entre os indivíduos como se fosse mais um hábito a ser seguido pelo bando.
No vídeo que você pode assistir abaixo, feito por um dos pesquisadores, dá para ver um primata sendo convencido por humanos. Enquanto usa o óculos que mantém sob custódia para palitar os dentes, o ladrãozinho recebe várias ofertas diferentes de objetos (comestíveis e até não comestíveis) para fechar negócio. Depois de passar alguns minutos irredutível, um pedaço de fruta finalmente parece mais interessante que o produto do furto, que então é deixado de lado.
(SUPERINTERESSANTE)