Conheça os trilhões de vírus que formam seu viroma

quinta-feira, 11 de outubro de 2018 às 18:03
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(Foto: Reprodução)

Se você acha que não tem vírus, pense de novo.

Pode ser difícil de entender, mas o corpo humano é ocupado por grandes coleções de microorganismos, comummente referidos como microbiomas, que evoluíram conosco desde os primeiros dias da humanidade. Cientistas começaram apenas agora a quantificar o microbioma, e descobriram que ele é o lar de pelo menos 38 trilhões de bactérias. Mais intrigante ainda, talvez, é que elas não são os micróbios mais abundantes que vivem em nossos corpos: esse prêmio vai para os vírus.

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Estima-se que há mais de 380 trilhões de vírus nos habitando – uma comunidade conhecida como viroma humano. Mas estes vírus não são aqueles perigosos dos quais ouvimos falar, como os causadores de gripe ou infecções mais sinistras como dengue ou ebola. Muitos destes vírus infectam as bactérias que vivem dentro de você e são conhecidos como fagos O corpo humano é um terreno fértil para fagos, e apesar de sua abundância, nós temos pouquíssimo conhecimento sobre o que eles – e todos os outros vírus em nosso corpo – estão fazendo.

Sou um médico e cientista que estuda o microbioma humano com foco em vírus, porque acredito que o aproveitamento do poder dos predadores naturais de bactérias irá nos ensinar como prevenir e combater infecções bacterianas. Pode-se presumir que se vírus são os micróbios mais abundantes do corpo, eles seriam o alvo da maior parte dos estudos de microbiomas humanos. Mas este é um grande equívoco: o estudo do viroma humano está tão atrás das análises de bactérias que estamos descobrindo apenas agora algumas de suas atribuições mais básicas. Este atraso acontece graças à demora que cientistas têm em reconhecer a presença do viroma humano, e a falta de ferramentas padronizadas e sotisficadas para decifrar o que exatamente está em nosso viroma.

O 411 no viroma

Esta são algumas das coisas que aprendemos até então. Bactérias no corpo humano não estão apaixonadas pelos muitos fagos que vivem à sua volta. Na verdade, elas desenvolveram  Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas (CRISP-Cas systems, em inglês) – para livrarem-se de fagos ou prevenir infecções deles. Por quê? Simples: fagos matam bactérias. Eles assumem o maquinário delas e as forçam a produzir mais fagos ao invés de mais bactérias. Quando terminam esse trabalho, explodem para fora das bactérias, destruindo cada uma delas – e, finalmente, ficam em nosso corpo esperando cruzarem caminhos com outras bactérias vulneráveis.

São, praticamente, stalkers de bactérias.

Está claro que há uma guerra sendo lutada na superfície de nosso corpo a cada minuto de cada dia, e nós não fazemos ideia de quem está vencendo – ou quais são as consequências desta guerra.

Vírus podem habitar todas as superfícies de nosso corpo, dentro ou fora. E em todos os lugares em que cientistas olharam para o corpo humano, vírus foram encontrados. Vírus no sangue? Sim. Vírus na pele? Sim. Vírus nos pulmões? Sim. Vírus na urina? Sim. E por aí vai. Para simplificar, quando estamos falando de onde os vírus vivem no corpo humano, é mais fácil parar com isso e mudar a pergunta para “onde eles não vivem?”.

Vírus são contagiosos. Mas muitas vezes nós não pensamos nos vírus bacterianos como facilmente transmissíveis. Pesquisas já provaram que simplesmente morar com alguém pode levar à rápida transmissão de vírus em seu corpo. Se nós não sabemos as consequências desta constante batalha entre bactérias e vírus em nosso corpo, então fica exponencialmente mais complicado considerar a batalha entre os vírus e bactérias compartilhados com todo mundo – incluindo seu companheiro, familiares e até mesmo seu cachorro.

Vírus nos mantém saudáveis?

Por último, nós precisamos entender o que todos estes vírus estão fazendo no corpo humano, e entender se podemos tirar vantagem do nosso viroma para melhorar nossa saúde. Mas até agora não está claro por que alguém acreditaria que nosso viroma pode ser benéfico.

Pode parecer contra intuitivo,  mas prejudicar nossas bactérias pode fazer mal à nossa saúde. Por exemplo: quando nossas comunidades de bactérias saudáveis são importunadas pelo uso de antibióticos, outros vilões microbiais, também conhecidos como patógenos, tiram vantagem desta oportunidade para invadir nosso corpo e nos deixar doentes. Em um grande número de condições humanas, as bactérias saudáveis têm papéis importantes na prevenção da intrusão de patógenos. E é nessa hora que entram os vírus. Eles já entenderam como matar bactérias. Eles vivem por isso.

A corrida, então, é para encontrar os vírus que já descobriram como nos proteger dos vilões em nosso viroma enquanto conseguimos manter as boas bactérias intactas. Há exemplos na utilização de fagos para tratar infecções com risco de vida de bactérias resistentes ao maior número de antibióticos disponíveis – um tratamento conhecido como terapia de fagos.
Infelizmente, estes tratamentos estão e continuarão dificultados pelas informações inadequadas sobre como fagos se comportam no corpo humano, e as consequências imprevisíveis de suas introduções em nós. Ainda assim, a terapia de fagos continua muito regulada. Nesse ritmo, pode demorar muitos anos até que fagos sejam usados rotineiramente em tratamentos anti-infeccionais. Mas não se engane: os vírus que evoluíram conosco por tantos anos não são apenas parte do nosso passado, mas continuarão tendo um papel significante no futuro da saúde humana.

(*David Pride é Diretor Associado de Microbiologia na University of California San Diego, e Chandrabali Ghose é cientista na The Rockefeller University. Ambos escreveram em inglês para o The Conversation)

(REVISTA GALILEU)

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