O cientista Stephen Hawking, conhecido por pronunciamentos sobre a existência humana de dar medo, afirmou há poucos dias que os seres humanos têm cem anos para deixar a Terra.
Segundo Hawking, estamos diante de ameaças sérias e possivelmente intransponíveis impostas pelas mudanças climáticas, asteroides, superpopulação e doenças. O cientista produziu um documentário em que ele e seu antigo aluno Christophe Galford viajam pelo mundo para descobrir como poderíamos viver off-planet – ou seja, em outro planeta.
Mesmo se for encontrada vida em outro lugar do nosso Sistema Solar, não será uma simples questão de “todos a bordo e tchau”. Sabe-se que os seres humanos têm dificuldades para sobreviver no espaço. Estamos perfeitamente adaptados à Terra, e ela está perfeitamente adaptada a nós, não importa quanto tentemos destruí-la. O espaço, por outro lado, não é um habitat humano por natureza.
Astronautas vivenciam isso na Estação Espacial Internacional (ISS), por exemplo. Seus músculos e ossos se expandem, o que pode ser doloroso. Ainda pior é a degradação óssea. Apesar de astronautas serem submetidos a rotinas de exercícios regulares quando estão em órbita, leva tempo para que seus corpos se reajustem quando eles retornam à Terra.
Um número significativo de astronautas é acometido por problemas de visão, desde vista embaçada até cegueira. E os cientistas não sabem o motivo. Talvez maior pressão dos fluídos na cabeça e no nervo ótico?
Há ainda o mal-estar generalizado que se sente no espaço. Em 1985, quando o então senador dos EUA Jake Garn voou num ônibus espacial, ele se sentiu tão mal que não conseguiu fazer nada durante toda a viagem. Então, astronautas, que não gostam de admitir que não têm jeito para o espaço, criaram uma nova unidade de medida: o garn. Um garn é quando se está “totalmente doente e totalmente incompetente”. A maioria dos astronautas sente até um décimo de garn.
Para onde iria a evolução?
A questão então passa a ser se pessoas normais têm jeito para o espaço. Há alguns pontos a considerar. Se os ossos humanos se deterioram, será que passaríamos por um processo de evolução no espaço que resultaria na perda deles? Poderíamos nos tornar seres amorfos, que respondem melhor à microgravidade? Na Terra, a vida começou há 3,8 bilhões de anos, com o surgimento dos domínios Bacteria e Archaea – ambos sem ossos.
Se os seres humanos são propensos à visão turva ou mesmo à cegueira espacial, talvez tenhamos que evoluir para uma vida sem olhos? Que outros sentidos podem estar em jogo? Pensemos na audição. Na Terra, ondas sonoras viajam ao causar vibrações, e são as vibrações que percebemos. Mas o espaço é um vácuo, onde as ondas sonoras não podem vibrar. Então não há som. O que poderia substituir esse sentido?
Falando em vácuo, como seria a respiração no espaço? Usar um traje espacial volumoso e um capacete o tempo todo não é nada agradável. Mas remover o acessório de cabeça no espaço levaria à asfixia quase instantânea. Será que evoluiremos ao ponto de não precisar mais de oxigênio? As bactérias viveram na Terra por 1,4 bilhão de anos antes do chamado grande evento de oxigenação, quando o oxigênio começou a se acumular em nossa atmosfera. Seria possível retornarmos a um estado pré-oxigênio?
O mal-estar espacial, por sua vez, é semelhante ao chamado enjoo de movimento ou cinetose, quando há confusão entre a visão e o sistema vestibular, responsável pelo equilíbrio. Caso passemos a existir sem o sentido da visão, pode ser que o problema do mal-estar no espaço seja resolvido. Mas se esse não for o caso, os futuros seres humanos amorfos evoluirão a ponto de girar lenta e constantemente para contrabalancear qualquer desequilíbrio?
Futuro improvável
Ralph Tiedemann, professor e líder de uma unidade de biologia evolutiva na Universidade de Potsdam, na Alemanha, concorda com Hawking quanto aos problemas graves que enfrentamos na Terra. Mas ele não espera que os seres humanos entrem em extinção “dada sua inteligência, capacidade de aprender e versatilidade”.
Para ele, a sobrevivência humana fora do planeta é algo muito mais difícil de imaginar. “De uma perspectiva evolucionária, o período mencionado [cem anos] é curto demais para esperar qualquer adaptação evolucionária, e a probabilidade de que um organismo complexo como o humano se adapte a um mundo completamente diferente me parece baixa”, afirma.
Axel Meyer, chefe do departamento de biologia evolutiva da Universidade de Constança, no sul da Alemanha, tem uma visão semelhante. “A vida, inclusive da nossa espécie, evoluiu no nosso planeta moldada por mutações aleatórias e seleção não aleatória”, diz o professor. “As pressões de seleção no espaço seriam muito diferentes – sem oxigênio, temperaturas, radiação, etc. Os seres humanos morreriam imediatamente.”
Para Meyer, o melhor é tentar não destruir o nosso planeta. “Não temos futuro algum num planeta diferente. Este é o nosso lar. É aqui que evoluímos e aonde pertencemos.”
(MSN)