Acordes na educação

segunda-feira, 6 de janeiro de 2025 às 14:47
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Hélio (Apolo) deus grego do Sol e da música – Chico Buarque (cantor e compositor)

*Por Valdo Rosário

“O nome de seu irmão era Jubal: ele foi o pai de todos os que tocam lira e charamela.” Bereshit = Be (No) Reshit). Gn. 4, 21. “O que assegura a comunicação entre os homens é a emoção partilhada por meio da linguagem […]. A linguagem não tem que designar o real apagando-se perante ele, mas tocar a alma.” (Pg. 45[1]).

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“Hoje você é quem manda falou, tá falado, não tem discussão, não. A minha gente hoje anda falando de lado e olhando para o chão, viu você inventou de inventar, toda essa escuridão. Você inventou o pecado e esqueceu-se de inventar o perdão. Apesar de você, amanhã há de ser outro dia. Eu pergunto a você, onde vai se esconder da enorme euforia, como vai proibir quando o galo insistir em cantar. Quem sabe um dia, por descuido ou poesia, você goste de ficar.” (Chico Buarque). A genialidade da música Apesar de você do Chico Buarque, a capacidade dele, em fazer uma crítica ao famigerado Regime Militar no Brasil (1964-1984) e também de falar dos amores Ágape, Philia e Eros, por meio do lirismo musical.

A música por meio da linguagem é inspirada pelo poder transcendental, para alegrar aqueles que tem sensibilidade para a magia do discurso e a beleza das artes. Por isso a música é o alimento da alma, para agradecer um poder maior e também de espalhar a paz entre as pessoas; onde se desenvolve a arte não precisamos de guerra. A música desperta em nós os mais artísticos sonhos desenvolvendo a procura das melodias lúdicas.

Talvez me chame de nostálgicos, imbuído de sonhos literários transformados nos acordes, arranjos, melodias e vocais dos músicos e interpretes; imaginação e letras dos poetas. A música é um benefício para o corpo e alma, ou talvez de loucos e apaixonados pelos trocadilhos de letras e cifras musicais que enraízam no mais intimo do nosso Ser. Enraizamento que desperta em nós as ideias mais profundas que florescem do nosso inconsciente, ideias que nos ajuda a sermos cidadãos livres, mesmo presos pela história, ciência, moral e religiões, que muitas vezes valorizam muito mais a morte do que vida física no mundo sensível.

O universo é uma grande orquestra. A música bela influencia nosso silêncio, pela magia do seu encantamento e melodia. É assim que os amantes da música se alimentam e se “embebedam” da harmonia musical, gerando um ciclo de vida infinita. A música bela faz bem para nossos ouvidos e aumenta a magnitude da nossa erudição, proporcionando paz que nos leva a uma reflexão existencial do Cosmo físico e metafísico e nos ajuda a fazermos um epoché (suspensão do juízo) diante do outro, inclusive antes de o jugarmos e condenarmos.

Um dos grandes problemas que nós educadores enfrentamos hoje, é que não conseguimos muitas vezes convencer os nossos alunos a ouvir e escutar o que tentamos repassar para eles; até porque uma grande parte dos alunos, muitas vezes só ouvem no sentido biológico. Segundo a fonoaudiologia, ouvir é um ato passivo, enquanto escutar é um ato ativo que desenvolve atenção e esforço para compreender o que é dito.  Ouvir é uma condição física, todos os animais tem essa capacidade. Escutar é quando compreendemos e interpretamos o que ouvimos… É importante salientar que muitos professores também só ouvem.  Por isso é importante a música no meio escolar para auxiliar no processo ensino-aprendizagem de discentes e docentes.

A boa música nos ajuda a escutar e compreender o mundo.  Quem escuta reflete e quem reflete desenvolve conhecimentos crítico e se situa em uma posição privilegiada para produzir cultura, fenômeno social que resgata o indivíduo do “fosso da alienação” – muitas vezes produto da falta de meios culturais e econômicos que possibilitem o afloramento de cultura livresca, erudição e experiência de vida capazes de produzir ideias lúdicas e significativas em muitos professores e alunos. A arte não pode ser a panaceia, o antídoto para curar o mundo de todos seus males, mas é, sem dúvida, um dos meios de garantia da nossa liberdade artístico-cultural, científica, política e religiosa, e sobretudo, um meio de garantia da aglomeração cultural e união de artistas e beneficiários da arte.

A arte proporciona liberdade numa prisão física. Assim, como o deus Prometeu que roubou uma tocha de fogo do deus Hélio e entregou para os homens, simbolizando a liberdade e o uso do fogo que determinou a primeira grande evolução dos homens. Devido a isso, segundo o mito, Prometeu foi castigado por Zeus durante de 10.000 anos acorrentado em uma montanha, para que durante o dia uma águia devorasse seu fígado, que à noite era reconstituído, para que no dia seguinte ser devorado novamente pela águia, em um ciclo de punição diária. Simbolicamente, o castigo de Prometeu representa o desafio de enfrentar Zeus (deus supremo na mitologia grega) para ajudar os humanos; também simboliza a sucessividade dos nossos problemas diários, que durante dia temos que resolvê-los, para à noite descansar e, no dia seguinte, nos depararmos com novo desafio da continuidade de uma nova batalha.

Caríssimos educadores, alunos, músicos e amantes das artes! Unimo-nos para ajudar a despertar àqueles que estão mergulhados no sono dogmático, sujeitos aos ritmos musicais que trazem como consequência a degeneração da psiquê. O discurso carregado de persuasão harmoniza-se com a música. Segundo o filósofo sofista Górgias de Leontinos: a música bem ritmada nos leva a qualquer lugar, o discurso precisa ser bem ritmado como a música para educar e valorizar sua importância.  A boa música é um recurso educativo essencial no ensino-aprendizagem, em todos os ramos e graus de conhecimentos.

Valdo Rosário, licenciado em filosofia pela PUC/GO, mestre em filosofia pela UFT/TO, professor de filosofia no Ensino Médio na rede pública do Pará; escritor e presidente da ALABIP (Academia de Letras e Artes do Bico do Papagaio).

[1] (ROMEYR-DHERBEY, Gilbert. Os Sofistas, Trad. João Amado, Lisboa/PT, Edições 70, 1986.

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