*Por Valdo Rosário
No Ensino Fundamental, uma das primeiras lições que os alunos recebem nas aulas de artes é o conhecimento das cores primárias e secundárias, para assim compreenderem que as cores secundárias são formadas em decorrência de mistura das primárias. Todos nós, quando na condição de neófitos no universo das pinturas, utilizamos caderno, lápis e pincel comum para reprodução ou criação de um desenho. Aqueles que desenvolvem com facilidade essas qualidades testam suas habilidades na pintura de uma tela, iniciativa que requer maior conhecimento artístico de tintas, tela e geometria.
Para o avanço da arte de Michelangelo L. B. Simoni (1475-1564), que pintou o teto da Capela Sistina no Vaticano, entre 1508 e 1512, são requisitos: a tradição cultural local; o amparo de bons Mestres da arte e dedicação do aprendiz. Assim, a arte de Michelangelo é considerada, não apenas um marco da pintura do período da Renascença, mas, uma das produções mais expressivas da história da arte de todos os tempos. Portanto, para um principiante migrar, do processo amador para galgar a pintura clássica, exige-se um conhecimento especializado das cores primárias e secundárias, experimento de tons e matizes na criação da “mimese” de uma arte pré-existente, segundo o filósofo grego Platão (428/7-348/7 a. C.) ou – perseguindo um grau superior de originalidade – conceber uma criação artística inédita, segundo o mesmo filósofo.
Após o término de um quadro artístico é necessário acondicioná-lo em um ambiente adequado à temperatura e luz, para que o trabalho artístico não perca sua qualidade. Imagina o quadro da “Monalisa” de Leonardo da Vinci (1452-1519), se fosse exposto em um ambiente inadequado. Com o tempo, perderia a vivacidade das cores até ser consumido pelas intempéries se perdendo no tempo e espaço. Nesse contexto, a arte precisa da habilidade de quem produz, de material adequado e de cuidado após a conclusão. Cumpridos estes requisitos, a arte não permanece presa ao passado, presente ou futuro, porque transcende ao tempo Cronos da física, se aliando com o tempo Kairós.
O querido leitor e tu, devem estar se questionando, o porquê de todo esse emaranhado de palavras e conceitos, para descrever a relação entre o Amor Eros e as artes plásticas. O leigo pode afirmar que este preâmbulo não tem nenhum sentido objetivo, mas… A arte contempla a objetividade e a subjetividade, portanto, a imaginação artística é necessária para corroer a falsa moral, ética, política, cultura, ciência e religião; porque os conceitos éticos e os demais, só se carregam de sentido edificante se forem vivenciados na práxis, a arte e o Amor Eros estão imbuídos nesse contexto.
Quanto a ti, faço uma relação de nossa história com um quadro de uma obra de arte, que precisa de uma maiêutica, aperfeiçoada por uma hermenêutica artística e filosófica, para que seja definida como bela. Nossa relação é como as artes transcende as convenções, porque estes elos estão mais além do mundo físico ou sensível, interagindo no inteligível. Platão aduz que o amor Eros caracteriza-se como uma condição de falta, uma vez que buscamos no ser amado, não o igual e diferente, e sim, aquilo que nos falta; o amor Eros, assim, a realização do amor Eros só é possível na companhia de alguém.
Se a obra de arte for exposta a um ambiente impróprio, com o tempo perderá sua essência até desaparecer; assim também é o Amor Eros. O tempo passou, olho sua foto do tempo que nos conhecemos, e vejo uma foto atual… Estou diante de uma confusão visual e conceitual: quem és tu? A pessoa que está na foto do passado ou a pessoa de agora? Assim como um quadro artístico, se for pintado com uma tinta de má qualidade uma tela ruim ou ficar exposto de maneira inadequada, com tempo a imagem desbotará, até desaparecer e tornar-se-á ausência (na mitologia, em especial a grega, o pior para um deus não é sua morte, e sim, tornar-se ausência). Como um desaparecimento de um quadro, percebo que estamos nos tornando ausência – física e sentimentalmente. É como se nossa história estivesse sendo consumida, tornando-se uma tela vazia de formas, cores e ideias… Ausência dos Amores: Ágape, Philia e Eros; caracterizando a essência da ausência ou a ausência da essência, da alma que, em “Anatomia do Espírito” Sigmund Freud (1856-1939) chamou, em voz baixa, de consciência.
A cada dia a nossa imagem enquanto humanidade está desaparecendo na curva melancólica do tempo Cronos, ficando somente como lembrança de um passado distante ou próximo, não importa: que diferença faz uma pessoa a mais ou a menos para a humanidade? Qual é realmente a cor dos teus olhos, castanho ou pretos? Teu rosto ainda tem ou não pigmentos? Teus cabelos ainda são pretos ou castanhos? Cacheados ou lisos? Teu sorriso ainda é o mesmo? Continua com “cinismo” do lendário filósofo grego Diógenes de Sinope (412-323 a. C.)?
Infelizmente, tua imagem está desaparecendo de minha memória… Nossa história é um quadro artístico que está contigo, mas, tu precisas conservá-lo em um ambiente adequado, para que a pintura não seja corroída pelo tempo.
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