
*Por Valdo Rosário
O falecimento do amante da literatura e torcedor do San Lorenzo – Jorge Mario Bergoglio – gerou notícia mundial em todos os meios de comunicações oficiais e também nas redes sociais, pela sua importância tanto religiosa e na diplomacia política-religiosa no mundo. Mas, quem é Bergoglio? O Papa Francisco, primeiro Papa latino-americano, também foi o primeiro Papa jesuíta e, o mais importante, ele conversou com diversos líderes políticos mundiais de todos os campos ideológicos. Recebeu minorias que, muitas vezes, são descriminalizadas dentro da própria Igreja; intermediou um encontro histórico entre Fidel Castro, presidente de Cuba e Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, em 2013. Um Papa que seu pontificado transcendeu os muros visíveis e invisíveis da Igreja.
O fenômeno da morte por mais estranho que seja para todos nós, infelizmente (ou felizmente) ele é necessário, porque somos seres falíveis e finito. E, no universo teológico em qualquer religião, a morte é a passagem transcendental da alma, portanto, não existe ressurreição ou reencarnação sem o sacrifício da cruz. Sendo assim, só existe vida pela existência do seu contrário, que é a morte. Entretanto, existe para os fiéis convictos de qualquer religião a certeza da ressureição – para os não convictos, a promessa da ressureição; para os agnósticos a dúvida e uma procura permanente da racionalização desse fenômeno; para os ateus, a não crença numa epifania no contexto religioso, porém, ser ateu não significa não ser um cristão na práxis, porque existem vários ateus que são muito mais cristão do que aqueles que todos os domingos estão em missas ou cultos e, diariamente, recitam versículo bíblicos em suas redes sociais. Contudo, na prática, são falsos-moralistas-religiosos.
Desejar a morte, o mau e querer que alguém, após seu falecimento, vá para o inferno – do ponto de vista jurídico – não é crime. No entanto, no universo ético e religioso é um problema de desvio de comportamento ou um biltre. Assim, espalhar mentiras e incitação ao ódio – tanto pessoal e nas redes sociais – além de mau-caratismo é crime no código e penal e canônico. E quem faz isso com a maior autoridade da Igreja – que é o Papa – e se auto denominar católico, apostólico romano, pode implicar em punição de acordo o código canônico
Cân. 1369 – […] e quem ofende gravemente os bons costumes, profere injúrias ou excita o ódio e o desprezo contra a religião ou a Igreja, seja punido com justa pena. Cân. 1373 – Quem excita publicamente aversão ou ódio dos súditos contra a Sé Apostólica ou contra o Ordinário, em razão de algum ato de poder ou ministério eclesiástico, ou incita os súditos à desobediência a eles, seja punido com interdito ou com outras justa penas. (CANÔNICO, 1983, pp. 597 e 599).
Qual o motivo deste preâmbulo canônico, pelo o falecimento do Papa Francisco? O objetivo não é defendê-lo, até porque ele não cometeu nenhum crime jurídico e canônico, aliás, quem comente crime são os que proliferam ódio e mentiras contra ele. Fazer crítica (Termo introduzido por Kant para designar o processo através do qual a razão empreende o conhecimento de si: “o tribunal que garante razão em suas pretensões legítimas, mas condene as que não tem fundamento”. (ABBAGNANO, 1998, p. 223). Portanto, a crítica não são meros devaneios pessoais e sim uma capacidade lógica de argumentação. Neste contexto, fazer crítica a Igreja e ao Papa é normal e permitido, agora existe uma diferença abissal entre crítica e divulgar mentiras e ódio nas redes sociais.
Com o falecimento do Papa o excrementismo político-religioso ressurgiram das catacumbas dos que se acham proprietários de Deus e que estão acima do bem e do mau, que se acham “pseudos-doutos” da política, religião, ética e moral; contudo, não passam de ignorantes que não conseguiram compreender nem o que é a doxa (opinião) filosófica, estão mergulhados na caverna platônica, submetidos a ignorância do mundo sensível.
O mais estranho é que jovens senhores e senhoras, vereadores, deputados e outras lideranças políticas brasileiras e pessoas comuns, alvoram-se nas redes sociais comemorando a morte do Papa, intitulando-se “deus” com poderes para julgar, condenar e enviar diretamente ao inferno a alma do Santo Padre. Uma pergunta simples – O que será que Jesus, os apóstolos, os santos, Santa Rita de Cássia e Santa Maria acharam disto? – No catolicismo querer usurpar o trono de Deus e do Papa não é dádiva ou mérito, sim um crime teológico e canônico.
Essas pessoas são doentes, com patologias graves ou mau-caráter, ou então as duas coisas juntas. Discordar, não gostar do pontificado do Papa Francisco, está no campo da crítica numa civilidade humana, agora partir para agressões e acusações, comemorar sua morte, querer envia-lo para o inferno… aí já é barbárie e o fim de qualquer diálogo civilizatório. Quem é católico e defende este tipo de barbárie religiosa, é preciso recorrer ao ato de contrição, fazer uma reflexão da consciência e, se no final de tudo isso não reconhecer que está errada, procure outra religião que defenda este tipo de aberração religiosa.
Isso é umas das provas que os templos católicos e evangélicos – ou os que dizem católicos ou evangélicos – e que proferem diariamente pessoalmente e nas redes sociais sua fé em nome de Jesus e dos Santos, são exatamente o que está no evangelho de São Mateus (Mt. 23, 23-28) e na carta de São Tiago (Tg. 3, 14-17). Falar sobre Jesus e declarar crença nele, não significa necessariamente conhecê-lo e ser cristão.
Valdo Rosário, licenciado em filosofia pela PUC/GO, mestre em filosofia pela UFT – Câmpus de Palmas/TO, professor efetivo de filosofia no Ensino Médio na Escola Est. Profa. Elza M. Corrêa Dantas – São Domingos do Araguaia/PA, 4ª DRE – Marabá – SEDUC/PA; membro correspondente da Academia de Letras de Rondon do Pará e Região (ALERPRE), membro fundador e presidente da Academia de Letras e Artes do Bico do Papagaio (ALABIP); autor de quatro livros: Philos-Poesia, Amor e Razão vol. 1 e 2, Do “Centu do Ogustu” a Augustinópolis.
Referências Bibliográficas
ABBGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São PAULO: Martins Fontes, 1998.
CANÔNICO, Código de Direito. Direito Canônico. São Paulo: Edições Loyola, 1983.
JERUSALÉM, Bíblia de. Bíblia Sagrada. São Paulo: Paulus, 1996.
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