*Por Paulo Martins
Qual Natal você escolheria como memorável? O qual nunca se esqueceu? Feche os olhos, sinta-se como se estivesse confortavelmente acomodado numa sala de cinema. Deixe desfilar pela memória aqueles natais que te fizerem tão bem, que, passe o tempo que passar, nunca serão esquecidos.
Lá em casa não tinha Árvore de Natal. Elas não faziam parte dos nossos costumes. Quando fomos morar em Goiânia, eu tinha apenas dois anos. Antes vivíamos no meio rural. A roça era um lugar que nem televisão tinha.
Entre os natais da minha infância, lá em casa, sempre me recordo de muita gente alegre reunida, bastante conversa. Comida com fartura, barulho de meninos correndo pela casa, pelo quintal, e muito amor.
Não me lembro de ceia de Natal com panetone, peru assado, bacalhau, vinho. As imagens que me vêm à memória são do vapor de um caldeirão aberto, em cima de uma fornalha. De dentro, saindo o cheiro gostoso de pamonhas, sendo retiradas e servidas.
Também vejo todos reunidos, preparando o porco engordado durante o ano. A carne de lata. A linguiça pendurada em cima da fornalha. O churrasco no dia 25 de dezembro.
O meu pai não comprava presentes, tinha outras prioridades: a alimentação e o aluguel. Eu via outras crianças ganhando bicicletas, bolas, jogos, miniaturas dos Superamigos…, e ficava feliz, porque eu sabia que também brincaria com os brinquedos. Eu não tinha os Superamigos da DC Comics, mas sempre tive os melhores amigos.
Ainda me lembro da bola de futebol Capotão número 5, ganhada pelo amigo, sendo retirado da embalagem e rolando pelo campo de terra. Me lembro da bicicleta, Bmx Monark, cheirando plástico novo, dos colegas compartilhando a alegria das voltas ao quarteirão sobre duas rodas.
Ganhei pouco presentes de Natal ao longo da infância. Dois deles ficaram gravados na memória. Eu dormia, meu irmão Zé, mais velho do que eu, enfiou debaixo da minha coberta um embrulho. Acordei sonolento. Abri o pacote, era uma patrola de plástico, amarela, em miniatura. Era o imaginável, mas não era sonho. Eu tinha ganhado um presente. O meu irmão, que hoje não mais está entre nós, fez uma criança feliz naquele dia.
O outro presente foi um carrinho. Foi o primeiro e único brinquedo a pilha que ganhei. Numa tarde nublada de Natal, logo depois de uma longa chuva, o meu irmão Antônio parou a moto na porta de casa. Desceu com um pacote nas mãos e disse, “É pra você”. Olhei desconfiado. Abri com cuidado, tentando em vão não rasgar o papel vermelho. Na caixa estava escrito Vai e Volta Estrela, dentro, uma pick up vermelha.
Saí à rua. Meninos e meninas brincavam e exibia seus presentes. Não sei dizer se todos tinham presentes, provavelmente não. Mas sei que todos brincamos. Compartilhamos os brinquedos naquele dia mágico.
No final de 2010, nos mudamos de Goiânia para Palmas. Fomos morar de aluguel, eu, minha esposa e meus dois filhos, ainda crianças. Demoramos a nos organizar financeiramente, praticamente não tínhamos móveis. Meu irmão e família veio passar o primeiro Natal com a gente. Não tínhamos Árvore de Natal. A minha cunhada cortou o galho de um coqueiro do quintal, enrolou habilidosamente algodão nas folhas. Pronto, passamos a ter a nossa Árvore.
Esses inesquecíveis natais nos mostram que os ingredientes de um Feliz Natal têm pouco a ver com sofisticação e dinheiro. Para preparar um memorável Natal, a gente vai precisar de uma boa música, comida bem-feita, relações saudáveis, gostosas risadas, amor, orações, agradecimentos e, se possível, uma árvore iluminada.
Paulo Martins é professor, mestre em Letras, autor dos livros “Cemitério das bonecas e outros contos (2022)” e “Vamos conversar: crônicas” (2017). @profpaulo_martins
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